Tuesday, November 5, 2024

28 - Os virtuosos

 

28 - Os virtuosos

 

      O que particularmente me dá grande alento a escrever sobre a música é notar o quão grande é a maestria, o virtuosismo e a qualidade cabal que muitos compositores e intérpretes possuem, o que se nota quando executam com perfeição uma música de alta complexidade.

      Fato notável, que nos deixa embasbacados, mas que ao mesmo tempo nos faz pensar: Como isto é possível? A resposta à esta questão, a pesar de parecer simples é difícil de crer. O virtuosismo advém da persistência inteligente. Ou seja: Tomar as atitudes corretas nos momentos precisos com grande vontade e perseverança. Quero dizer aqui que as atitudes dos virtuosos, em seus momentos de interpretação de uma música não são explosões heróicas, ainda que assim possam parecer para a percepção de um público extremamente impressionado, na verdade aquele momento é o resultante final de uma série de pequenas conquistas que o virtuoso fez no decorrer de seu treinamento para aquela ocasião, ou mesmo o resultado de muitos degraus calcados no decorrer de toda uma vida. É assim que aquilo, mesmo parecendo um milagre ou um feito de proporções incontestavelmente monstruosas não o é, mas o resultado de uma demorada escalada. Seria errado crer que um alpinista chegou no cume de uma montanha num vôo impressionante, o correto é notar o quão demorada foi sua jornada para chegar até ali, que  só está ali porque caminhou um passo de cada vez naquela direção, ainda que seja um feito magnífico não é um feito mutante ou sobre-humano. O método e um pensamento regrado e consciente são os alicerces dos grandes feitos.

      Igualmente se passa no treino para uma maratona, fazendo uma analogia, o método empregado à se atingir a perfeição é o mesmo, o campeão é pois um virtuoso. Acompanhar um virtuoso, seja na música, seja na corrida é quase que inacreditável, perguntamo-nos de quem realmente nos prostramos diante. Quê tipo de gênio têm tal força de execução, criação ou ação? De onde proveio tal envergadura de atuação? O fato é que tudo pede muito tempo de treino, e como se isto não bastasse este treino deve ser aproveitado de maneira específica, instituído de um “método de progressão”, e acima de tudo um projeto. Método e organização também, as ações não devem ocorrer de qualquer maneira, perder-se-ia assim uma progressão linear calcada em base sólida e segura, tampouco não é recomendável fazer a coisa da maneira errada, deste outro modo ao invés de andar para frente andaríamos para trás perdendo-nos numa confusão sem precedentes. Outro empecilho é a falta de motivação, um desânimo da vontade e da força do espírito que faria por retardar o projeto de maneira incalculavelmente grande, ou tão proporcional quanto é a motivação.

        Num empreendimento temos duas características imprescindíveis, que devem ser levadas em consideração: A) A forma de fazer; B) A vontade, e fé inabalável no crer que o que se faz é proveitoso. – Estes dois termos resumem de maneira espantosa o que se entende por “virtuosismo”, seja este artístico ou atlético.

      Aliamos estes dois fatores ao tempo disponível e nos deparamos diante de um músico de calão não demonstrável por palavras, nem por alusões racionais.

      Podemos refutar grande parte do que foi dito, senão até tudo colocando a idéia de uma “intenção virtuosa”, um caso em que não haja necessariamente um “virtuosismo da execução mecânica” de uma peça, esta seria a ênfase ao que o músico quer transmitir e não à maneira como transmite, uma ênfase mais aos sentimentos e idéias que ao veículo utilizado para transmiti-los. Basicamente é o mesmo que dizer que o musico não se importa com o modo que usa para transmitir, mas que transmite.

      Como um quadro pode não ser realista, mas dá aspectos desproporcionais às imagens, que mesmo que não sejam nem realistas nem virtuosas podem nos atingir muito mais que um quadro virtuoso e realista. A intenção é absolutamente virtuosa, mesmo que o veículo de transmissão pareça ser anormal, disforme ou estranho, quando na realidade pode haver sido até mais adequado e intenso que se tivesse sido uma virtuosidade realista.

      Fazendo uma analogia podemos relacionar e contrastar os corredores virtuosos da elite com os fanfarrões e sentimentalistas que compõe o grande contingente de corredores, o veículo de transmissão da essência do ser, ou se preferirem: dos sentimentos e idéias é representado pelo ato de correr, o modo de expressão no entanto é visivelmente diferente. Uns são perfeitos em execução, outros em expressão. O ideal por certo é que haja um equilíbrio entre estas duas vertentes: Execução virtuosa e expressividade. Tanto na corrida quanto na música ou qualquer outra atividade humana.

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