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- Os virtuosos
O que
particularmente me dá grande alento a escrever sobre a música é notar o quão
grande é a maestria, o virtuosismo e a qualidade cabal que muitos compositores
e intérpretes possuem, o que se nota quando executam com perfeição uma música
de alta complexidade.
Fato notável,
que nos deixa embasbacados, mas que ao mesmo tempo nos faz pensar: Como isto é
possível? A resposta à esta questão, a pesar de parecer simples é difícil de
crer. O virtuosismo advém da persistência inteligente. Ou seja: Tomar as
atitudes corretas nos momentos precisos com grande vontade e perseverança.
Quero dizer aqui que as atitudes dos virtuosos, em seus momentos de
interpretação de uma música não são explosões heróicas, ainda que assim possam
parecer para a percepção de um público extremamente impressionado, na verdade
aquele momento é o resultante final de uma série de pequenas conquistas que o
virtuoso fez no decorrer de seu treinamento para aquela ocasião, ou mesmo o
resultado de muitos degraus calcados no decorrer de toda uma vida. É assim que
aquilo, mesmo parecendo um milagre ou um feito de proporções incontestavelmente
monstruosas não o é, mas o resultado de uma demorada escalada. Seria errado
crer que um alpinista chegou no cume de uma montanha num vôo impressionante, o
correto é notar o quão demorada foi sua jornada para chegar até ali, que só está ali porque caminhou um passo de cada
vez naquela direção, ainda que seja um feito magnífico não é um feito mutante
ou sobre-humano. O método e um pensamento regrado e consciente são os alicerces
dos grandes feitos.
Igualmente se
passa no treino para uma maratona, fazendo uma analogia, o método empregado à
se atingir a perfeição é o mesmo, o campeão é pois um virtuoso. Acompanhar um
virtuoso, seja na música, seja na corrida é quase que inacreditável,
perguntamo-nos de quem realmente nos prostramos diante. Quê tipo de gênio têm
tal força de execução, criação ou ação? De onde proveio tal envergadura de
atuação? O fato é que tudo pede muito tempo de treino, e como se isto não
bastasse este treino deve ser aproveitado de maneira específica, instituído de
um “método de progressão”, e acima de tudo um projeto. Método e organização
também, as ações não devem ocorrer de qualquer maneira, perder-se-ia assim uma
progressão linear calcada em base sólida e segura, tampouco não é recomendável
fazer a coisa da maneira errada, deste outro modo ao invés de andar para frente
andaríamos para trás perdendo-nos numa confusão sem precedentes. Outro
empecilho é a falta de motivação, um desânimo da vontade e da força do espírito
que faria por retardar o projeto de maneira incalculavelmente grande, ou tão
proporcional quanto é a motivação.
Num
empreendimento temos duas características imprescindíveis, que devem ser
levadas em consideração: A) A forma de fazer; B) A vontade, e fé inabalável no
crer que o que se faz é proveitoso. – Estes dois termos resumem de maneira
espantosa o que se entende por “virtuosismo”, seja este artístico ou atlético.
Aliamos estes
dois fatores ao tempo disponível e nos deparamos diante de um músico de calão
não demonstrável por palavras, nem por alusões racionais.
Podemos
refutar grande parte do que foi dito, senão até tudo colocando a idéia de uma
“intenção virtuosa”, um caso em que não haja necessariamente um “virtuosismo da
execução mecânica” de uma peça, esta seria a ênfase ao que o músico quer
transmitir e não à maneira como transmite, uma ênfase mais aos sentimentos e
idéias que ao veículo utilizado para transmiti-los. Basicamente é o mesmo
que dizer que o musico não se importa com o modo que usa para transmitir, mas
que transmite.
Como um quadro
pode não ser realista, mas dá aspectos desproporcionais às imagens, que mesmo
que não sejam nem realistas nem virtuosas podem nos atingir muito mais que um
quadro virtuoso e realista. A intenção é absolutamente virtuosa, mesmo que o
veículo de transmissão pareça ser anormal, disforme ou estranho, quando na
realidade pode haver sido até mais adequado e intenso que se tivesse sido uma
virtuosidade realista.
Fazendo uma
analogia podemos relacionar e contrastar os corredores virtuosos da elite com
os fanfarrões e sentimentalistas que compõe o grande contingente de corredores,
o veículo de transmissão da essência do ser, ou se preferirem: dos sentimentos
e idéias é representado pelo ato de correr, o modo de expressão no entanto é
visivelmente diferente. Uns são perfeitos em execução, outros em expressão.
O ideal por certo é que haja um equilíbrio entre estas duas vertentes: Execução
virtuosa e expressividade. Tanto na corrida quanto na música ou qualquer
outra atividade humana.
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